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José Aguiar fala sobre webcomics, o mercado de HQs e seu uso em sala de aula


O quadrinista trouxe seu olhar sobre o papel social dos quadrinhos na área da comunicação

José Aguiar mostra suas obras ao NCEP

(José Aguiar mostra suas obras ao NCEP)

José Aguiar é fã de histórias em quadrinhos desde criança, quando desenhava personagens da TV e de HQs. Hoje, é reconhecido no cenário nacional da área. É também roteirista da editora independente Quadrinhofilia; cocriador da Cena HQ, que oferece leituras dramáticas de quadrinhos; curador da Gibicon (Convenção de Quadrinhos de Curitiba); e publica tiras da série “Nada com Coisa Alguma” no jornal Gazeta do Povo. O quadrinista recebeu prêmios como o Troféu HQMIX, o Ângelo Agostini, venceu o I Concurso Internacional de Quadrinhos do Senac –SP, e foi indicado ao Prêmio Jabuti.

Aguiar foi um dos convidados da Semana Acadêmica de Comunicação Social, e o NCEP conversou com ele sobre a relação da sua trajetória no mundo das HQs e a comunicação.

NCEP: Como é o espaço para quem faz quadrinhos no Brasil?

JA: Estamos vivendo um crescimento absurdo do mercado dos quadrinhos. Só no ano passado foram mais de dois mil títulos lançados no Brasil, entre títulos de editoras e independentes, o que mostra uma vontade do público de ler HQ. Aqui em Curitiba, mais especificamente, fui um dos co-criadores da Gibicom, em 2011. A gente fez um evento piloto para ver se a cidade tinha demanda, e de repente, 15 mil pessoas responderam, provando que essa demanda existe. Não só em Curitiba, mas no Brasil todo, tem eventos de quadrinhos cada vez mais poderosos pipocando, como o CCXP (Comic Com Experience)e o FIQ (Festival Internacional de Quadrinhos) de Belo Horizonte. O mercado ainda não está, em termos de números, do jeito que nós gostaríamos, porque nós temos mais autores do que leitores, mas tem alguns autores que já são best sellers, que estão muito bem cotados na imprensa e no meio literário também. E é interessante que nós estamos saindo daquele estereótipo de quadrinhos infantis e quadrinhos de super heróis, e temos muito quadrinho autoral, meio no qual eu me enquadro. Um quadrinista que busca falar sobre o Brasil de hoje, sobre questões mais pessoais, sociais, às vezes fazendo coisas um pouco mais experimentais, e hoje há espaço para isso. Ter dois mil títulos não significa ter um mercado saudável, mas nós já conquistamos espaço nas livrarias, por exemplo.

NCEP: Sua obra mais recente, “A Infância no Brasil”, foi disponibilizada completamente pela internet. Você acha que isso é uma tendência?

JA: Cada livro meu tem uma formatação diferente, um estilo de desenho diferente, eu tento buscar o melhor para cada projeto. “A Infância do Brasil” foi pensado há quatro anos, o Brasil estava em um momento que haveria Copa do Mundo. O mundo estaria olhando para cá, e eu pensei: “Como que eu faço isso chegar ao Brasil inteiro?”. Por que uma das nossas dificuldades para ganhar mais leitores é a distribuição, que é muito deficitária. A logística é complicada, as livrarias têm dificuldade de aceitar autores de editoras menores, e eu pensei que a internet seria um bom caminho. Queria fazer um quadrinho sobre o Brasil que fosse lido mundo afora, e até por isso já fiz ele traduzido para mais três idiomas, inglês, francês e espanhol, para ter a maior audiência possível. Ao mesmo tempo, na Internet tem uma dispersão enorme. Ano que vem eu vou lançar uma edição impressa de “A Infância do Brasil”, justamente para pegar a parcela do público que não tem paciência de ler quadrinhos na internet. É interessante, porque tem a tendência das webcomics, mas é para um segmento, e tem outro segmento que valoriza o objeto livro.

NCEP: Qual você acredita ser o impacto dos quadrinhos na sociedade?

JA: O quadrinho sempre vai refletir o presente de quem está produzindo. Mesmo falando do passado, você está pondo o teu olhar do mundo de hoje sobre uma história que se passa nos anos quarenta, no século XIX ou XVII. Eu acredito que o quadrinho é uma ótima ferramenta para trazer reflexão. Hoje, você tem o empoderamento feminino nos quadrinhos cada vez maior, e isso está refletido tanto nos quadrinhos infantis quanto nos voltados ao público adulto. Você tem uma agilidade muito grande para produzir quadrinhos, eles são infinitamente mais baratos que um filme. Infelizmente a gente não tem o mesmo alcance, mas o quadrinho gera um diálogo e uma proximidade entre o leitor e o autor quadrinho tem uma dinâmica, um formato de linguagem que alinha imagem e texto, que traz uma capacidade de síntese de ideias muito grande, e isso, socialmente, faz muito bem. Não é a toa que o MEC tem adotado quadrinhos em sala de aula, reflexo da importância e do entendimento de que o quadrinho é uma ferramenta de ensino superpoderosa, seja ele entretenimento ou não.

NCEP: Quais são suas considerações sobre o uso dos quadrinhos no ensino?

JA: Uma das maiores críticas que os autores de quadrinhos têm com as políticas de incentivo é que elas pensam o quadrinho só como uma muleta para levar obras clássicas através de adaptações. Eu entendo uma adaptação como uma obra nova, uma releitura da obra original, que deve servir para incentivar o aluno a descobrir a obra original. O quadrinho tem que servir como uma ponte, existir como obra em si, ter seu valor, e não ser simplesmente um resumo, ou perde seu valor artístico. O desafio está também em equipar o professor para que ele saiba ler quadrinhos e utilizá-los de uma forma mais inteligente. Não se pode ficar refém da adaptação literária, deve-se também levar a voz do autor atual que está falando sobre coisas atuais do país. Tem quadrinhos sobre ditadura, sobre escravidão, com temas e abordagens da história do Brasil muito variadas e diversas, que não se vê muitas vezes nem em livros de história, e o uso deles pode ser muito positivo.

“Não é a toa que o MEC tem adotado quadrinhos em sala de aula, reflexo da importância e do entendimento de que o quadrinho é uma ferramenta de ensino superpoderosa, seja ele entretenimento ou não”.

Para conhecer melhor o trabalho do quadrinista: http://quadrinhofilia.com.br/


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