Universidades brasileiras adotam políticas de acolhimento a refugiados
Aumento de sua chegada ao Brasil tem exigido que medidas sejam tomadas pelo governo e instituições para a recepção e adaptação dos novos habitantes
(Universidades se tornam espaços de convivência e integração para imigrantes e refugiados)
Segundo a ONU, mais de 65 milhões de pessoas foram obrigadas a deixar suas casas no último ano. A crise humanitária que colocou-as em deslocamento teve um aumento, e agora o Brasil também entra no debate. A política nacional de acolhimento aos refugiados, que conta com o apoio das universidades, tem funcionado relativamente bem.
A chegada em massa dessas populações tem tido um grande apoio, principalmente no meio acadêmico. A Universidade Federal do Paraná (UFPR), por exemplo, conta com o Programa de Extensão Política Migratória e Universidade Brasileira (PMUB), composto por seis projetos de extensão com ações direcionadas a refugiados ou pessoas em visto humanitário. O programa presta assessoria jurídica, oferece aulas de português brasileiro, cursos de informática, atendimento psicológico e aulas de história do Brasil.
“Projetos como esses, realizados por voluntários, mostram como ainda há espaço para solidariedade, hospitalidade e acolhimento por parte dos brasileiros, apesar dos tempos de ódio em que estamos vivendo. Além disso, os projetos atuam como instrumento na luta dessas pessoas para que se tornem cidadãos e passem a ser sujeitos de sua própria história” afirmou a professora de Direito da UFPR e coordenadora do programa Tatyana Friedrich.
O fato é que este é um fenômeno novo que a sociedade brasileira ainda está aprendendo a lidar. A solução encontrada pelo Brasil para atender à diáspora haitiana foi a regulamentação do visto permanente por razões humanitárias.
Outros conflitos como a guerra na Síria e a situação econômica da Venezuela também fazem com que todos os dias ainda cheguem centenas, ou milhares de refugiados no país. Estimativas apontam para cerca de 6 mil haitianos e mil sírios morando em Curitiba.
Ainda segundo Tatyana: “Quem sabe o que é refúgio ou conhece um refugiado acaba inevitavelmente acolhendo independente de ser no meio acadêmico ou na própria sociedade. O problema é que as pessoas não conhecem a realidade e acabam sendo manipuladas por pessoas que não falam a verdade e expressam discriminação, intolerância e xenofobia.”
Um futuro acadêmico
Dentre todas as realizações do PMUB, cabe destacar as resoluções 54/14 e 35/16 do Cepe (Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão) que trata da revalidação de diplomas de migrantes e refugiados.
Já a resolução 13/14 diz respeito a cursos de nível superior iniciados no país de origem e que podem ser continuados em um equivalente da UFPR. O ingresso do Mestrado e Doutorado do curso de Direito também reserva até 5 vagas para migrantes com visto humanitário ou refugiados.
(Festa junina promovida pelo PMUB na Reitoria da UFPR contou com a presença dos estudantes do projeto, que compartilharam músicas de seus países e comeram comidas típicas da festa brasileira)
Fomento à discussão na universidade
A produção científica na UFPR com base no assunto também pode ser considerada de volume significativo. Vários professores e alunos já publicaram artigos e capítulos de livros em periódicos qualificados em decorrência dos estudos, experiências e resultados obtidos através do Programa.
Em abril de 2016, em parceria com a Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados), foi lançado o livro “Refúgio e Hospitalidade”. A publicação reflete sobre a situação dos refugiados no Brasil através da análise de juristas, linguistas e cientistas sociais, apontando caminhos para uma atuação efetiva na acolhida dessas pessoas.
Quem são os refugiados?
A Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados estabelece os direitos dos indivíduos aos quais é concedido o pedido de asilo, bem como as responsabilidades das nações concedentes.
Para um estrangeiro ser considerado refugiado no país é preciso que ele tenha seu pedido deferido pelo Conare (Comitê Nacional dos Refugiados), um órgão ministerial vinculado ao Ministério da Justiça. A Convenção, de 1951, é regulamentada no Brasil através da Lei 9747/97.
De acordo com ela, um refugiado é a pessoa que experimentou perseguição no país de origem ou de residência, seja por questão de nacionalidade, raça, religião, pertencimento a grupo social ou opinião política, e se encontra fora dele, sem poder ou querer retornar. A legislação brasileira amplia esse conceito, e também considera refugiado a pessoa que sofre violação generalizada de seus direitos humanos no seu país de origem.
Aqui, os refugiados têm um status semelhante ao do estrangeiro residente no Brasil, com algumas peculiaridades. Possuem todos os direitos civis e constitucionais, mas não os políticos – a solicitação de refúgio já concede o direito de possuir carteira de trabalho, por exemplo.
A principal diferença para o migrante é que, além da proteção Internacional, os que estão em asilo humanitário não podem ser extraditados para o país de origem, e a ele não se aplicam sanções relativas a sua entrada irregular no país.
Para pensar:
“Uma pessoa que chega assim, não veio porque ela quis. É porque foi obrigada. Você perde seu nome, sua casa, sua família, tudo. É só um tempo depois que você percebe que sua vida caiu em desgraça. As pessoas te olham como um invasor mas o único futuro que há agora, é aqui. Eu trabalho com o idioma e aqui sou um analfabeto. Eu não sei falar e não sei escrever em português, como é que eu vou trabalhar? Eu aceito qualquer tipo de emprego, eu só quero me manter de algum jeito.” Juan González*, jornalista na Argentina, teve de fugir do país natal por perseguições políticas e ameaça à integridade física, e está há 3 meses em Curitiba.
(*nome fictício)